quinta-feira, abril 15, 2021

Memórias dos Anos 90: Código de Barras I

Embora a Seal viesse a trabalhar com muitas outras coisas, ela era conhecida principalmente por vender equipamentos relacionados a código de barras. Já escrevi alguns posts técnicos sobre isso, aqui vou dar uma visão mais geral sobre o assunto no contexto da Seal.


Hoje em dia todo mundo sabe o que é um código de barras, mas quando eu entrei na Seal ainda era algo novo, mas já em pelo uso no varejo. Eu sempre me pergunto como devem ter sido duros os primeiros tempos da Seal, quando os produtos de supermercado ainda não vinham marcados.

A ideia básica de código de barras é simples: uma sequência de barras (ou blocos nas versões bidimensionais)  onde está codificado um número ou texto. Com o equipamento apropriado este número ou texto é lido automaticamente, substituindo a digitação. Uma vantagem do código de barras nos produtos do varejo é que a sua impressão pode ser feita junto com a impressão da embalagem ou rótulo, não acarretando um custo adicional (significativo) por produto.

O uso mais conhecido é no supermercado, mas acho que a maioria não tem ideia das consequência disso. Alguns até acham que é apenas um meio do lojista enganar o consumidor... Antes do código de barras e dos PDVs, o caixa lia e digitava o preço dos produtos (eu vi isso por anos). Além de dificultar a remarcação nos tempos da inflação, este processo era relativamente lento e propício aos erros. E o resultado final era apenas uma sequência de números, difícil de ser conferida pelo consumidor e que poucas informações trazias para o lojista. Com o código de barras e o PDV é possível emitir um ticket contendo a descrição do produto e o lojista pode saber, em tempo real, o que ele está vendendo.

Na época que eu entrei os fabricantes ainda estavam aprendendo sobre código de barras. Algumas não entendiam que cada produto tinha que ter o seu próprio código (tinha até quem inventava o seu código). Os requisitos técnicos também eram poucos conhecidos. Um equipamento usado pela engenharia da Seal permitia analisar um código de barras e verificar coisas como variações na largura das barras, contraste e as "zonas de silêncio" (região em branco antes e depois do código). Lembro que tinha uma caixa cheia de produtos enviados pelos clientes que apresentavam problemas de leitura. Um deles era um repelente de embalagem amarela com texto em vermelho: o código de barras estava impresso em vermelho o que é um tremendo não para a leitura por laser (também vermelho).

O produto básico era o leitor, disponível em vários modelos. A Seal revende até hoje os produtos da empresa americana Symbol, que tem uma história interessante. O seu começo foi digno do "sonho americano": o cientista que cria uma invenção e constrói uma empresa a partir dela. Durante os meus anos de Seal a Symbol teve um crescimento imenso, se expandindo dos leitores para os coletores de dados e a comunicação por radiofrequência (vou falar bastante sobre isso). No começo dos anos 2000, entretanto, teve um escândalo financeiro (o então presidente está até hoje na lista de procurados, apesar de alegar inocência). Depois disso foi comprada para a Motorola (não a que fazia celulares, mas a que fazia rádios). Por fim, num lance inesperado, foi comprada em 2014 pela Zebra Technologies uma empresa até então mais conhecida pela impressoras de código de barras (sobre a qual vou falar no próximo post).

Um "detalhe" é que o ponto forte da Symbol eram os leitores manuais (em formato de pistola). O leitor para supermercado só vendia bem aqui no Brasil e era considerado (principalmente pelos concorrentes) tecnicamente inferior. Não que fosse um projeto simplório: o leitor gerava um padrão complexo de feixes (para poder ler códigos de qualquer orientação) e fazia um processamento complexo para garantir leituras rápidas mesmo com códigos longe das condições ideias.

Aliás, teve um vez que a inteligência do leitor se revelou prejudicial. Uma das técnicas para acelerar a leitura era ser capaz de ler separado as duas metades do EAN-13 (o código usado no varejo) e depois juntá-las. Para evitar leituras incorretas, o check digit do código era verificado. Pois não é que aconteceu de um supermercado descobrir uma combinação de produtos que, se colocados no campo do leitor, podiam causar junção da primeira metade de um com a segunda metade do outro? A rigor o operador deve tomar cuidado de não deixar dois produtos no campo de leitura, mas, por segurança, depois disso foi recomendado configurar os leitores com esta feature desligada.

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