quinta-feira, janeiro 07, 2021

Memórias dos Anos 80: A Humana Informática

Em 1986 eu mudei de emprego. Sair da Scopus foi uma decisão que amadureceu por algum tempo, mas a escolha da nova empresa foi mais por instinto que por uma avaliação detalhada.


A saída da Scopus foi motivada pela frustração de desenvolver software em uma empresa de hardware. Ficava aquela sensação de que o desenvolvimento interno de software era um mal (ou custo) que tinha quer ser carregado pelo resto da empresa. 

Devo admitir que não conhecia muito a Humana Informática antes de começar a trabalhar lá. A escolha foi devido a duas pessoas. A primeira foi o dono da Humana, Mário Kaphan, que tinha sido a pessoa que tinha me contratado como estagiário na Scopus. Desde o primeiro contato tinha mostrado uma paixão por software, que mantém até hoje. A segunda foi um colega de estágio na Scopus, David, que tinha ido para a Humana alguns tempos antes (nos dois continuaríamos a nos encontrar na nossa vida profissional e atualmente somos sócios).

A Humana era uma empresa pequena, que ocupava um pequeno conjunto num prédio em Pinheiros, no que atualmente é o começo (ou fim?) da Avenida Faria Lima (milagrosamente este prédio sobreviveu à expansão da avenida, que se daria anos depois de termos saído de lá). O primeiro bom sinal foi quando fui lá pedir emprego e dei logo de cara com uma estante cheia de livros e revistas sobre software.

A Humana naquele ponto eram sete pessoas. O Mário, além das tarefas de dono, colocava a mão no código (a concisão do seu código em C virou uma lenda) e fazia as negociações comerciais. Eu e o David éramos o desenvolvimento. Junto comigo começou o Carlos, para cuidar do suporte pré e pós venda. Uma moça (me foge o nome!) cuidava do marketing e anotar pedidos. Tinha ainda a Edna (secretária / auxiliar administrativa / contas a pagar e receber) e um office boy.

Eu e o David também dávamos a nossa ajuda no suporte. Uma das primeiras lembrança que eu tenho da Humana foi o David com um cigarro na mão (eu nunca tinha visto ele fumando antes) falando no telefone "Aperte Page Down, a tecla 3 do bloco numérico" e aí dando uma tragada profunda, daquelas de deixar a ponto do cigarro vermelha. Ah, é mesmo, nos anos 80 ainda se fumava nos escritórios e o teclado do PC não tinha teclas separadas para movimentação do cursor. Tanto o Mário como o David eram fumantes, mas depois largariam este habito.

A Humana tinha sido fundada com as economias do Mário e o seu crescimento seria quase todo movido pelos seus lucros (mais para frente teve um empréstimo obtido em uma linha governamental). E a Humana cresceu muito, dobrando em área, pessoas e faturamento nos anos seguintes (até 1990...).

Após sair da Scopus, o Mário tinha avaliado algumas ideias até chegar no que seria o produto da Humana: software de comunicação de dados para compatíveis com o PC-IBM. É um pouco difícil explicar o que é isso para quem já nasceu conhecendo a internet.

Nesta época internet era coisa de pesquisa e rede local era algo que ia acontecer "no ano que vem". A comunicação à distância entre equipamentos era feita usando modems e linha telefônica. Um modem rápido comunicava a 1200 bits por segundo (e não muito bem, a taxa de caracteres alterados, suprimidos ou criados era bem alta). Micros nas empresas eram uma novidade, os processamentos "sérios" eram feitos em computadores maiores. A reserva de mercado tinha sido inaugurada com a proibição da importação de mini computadores e a aprovação da fabricação nacional de meia dúzia de minis, a maioria máquinas esquisitas com tecnologia licenciada de empresas estrangeiras (a exceção era o Cobra 500, uma máquina esquisita de projeto nacional). 

Surgia a necessidade de fazer os micros se comunicarem com os minis e mainframes. Uma primeira aplicação era a emulação de terminal. Um pouco mais sofisticada era a transferência de arquivos entre o micro e o mini ou mainframe. Outra necessidade era a comunicação entre dois micros, principalmente para troca de arquivos. Existiam alguns serviços "on-line", coisas exóticas como "correio eletrônico" (muito pouco usado), BBS (Buletim Board System), consulta às cotações da bolsa e o videotexto (que merece um post só para ele). A Humana focava empresas, o usuário "pessoa física" não tinha muito o hábito de pagar por software. 


2 comentários:

Anônimo disse...

Feliz Ano Novp. Estava ansioso pela volta de suas memórias na quinta-feira. Abração !

Anônimo disse...

Videotexto e BBS, bateu uma saudade aqui! Abraço!