terça-feira, março 27, 2007

Bill Gates

Ocasionalmente alguém cai no meu blog procurando a "Biografia de Bill Gates". A biografia que eu conheço e lí é Gates de Stephen Mames e Paul Andrews. A história do surgimento da industria dos computadores pessoais (incluindo a Microsoft) pode ser lida em Fire in the Valley de Paul Freiberger e Michael Swaine.

Da leitura destes livros me veio uma imagem de Bill Gates diferente daquilo que a media normalmente apresenta. Sem dúvida ele tem grande conhecimento técnico e é um grande programador. Também é inegável o seu faro em reconhecer oportunidades. Entretanto, tudo isso me parece secundário frente ao que considero ter sido o principal motivador de Bill: fechar o negócio. Para mim é esta agressividade comercial a principal marca da Microsoft, pelo menos até o ano 2000. Agressividade esta que às vezes encrencou a Microsoft e que levou a práticas algumas vezes consideradas ilegais pela justiça americana.

Relato abaixo duas situações famosas, descritas em detalhes nos livros que citei, e que acredito reforçarem a minha opinião sobre Bill Gates.

O Surgimento da Microsoft

A maioria das pessoas já ouviu falar de como Paul Allen foi correndo mostrar para Bill Gates a edição de janeiro de 1975 da revista Popular Electronics que trazia na capa o Altair 8800 da MITS e neste momento os dois decidiram fazer um interpretador BASIC para ele. Muitos talvez saibam que Bill Gates ofereceu o produto para a Altair, apesar de não ter começado o desenvolvimento, e como a primeira versão foi construída rapidamente. O que poucos sabem é que este foi um mau negócio na ponta do lápis.

O Altair 8800 que aparecia na capa era um mockup de papelão (o protótipo, que não incluia ainda o famoso barramento S-100, foi perdido no transporte). Para aparecer na capa da revista, Ed Roberts (o dono da MITS) chutou um preço bem baixo e corria o risco de ter prejuizo. A solução era lucrar nos acessórios e o principal deles era a placa de memória. O kit original vinha com apenas 256 bytes de Ram, quem queria fazer algo sério precisava da placa de 4K e do BASIC da Microsoft. A placa de memória tinha uma margem imensa e um imenso problema: não funcionava. Não demorou muito para alguém se cansar da placa de memória da MITS, projetar uma e descobrir que dava para vender uma placa que funcionava por um preço bem inferior. Ed Roberts resolveu apelar para o seu trunfo: o BASIC. A MITS tinha um contrato de exclusividade do BASIC da Microsoft para processadores 8080 e compatíveis e Ed Roberts passou a vender o BASIC por $150 para quem comprasse a placa da MITS e $500 para os outros. A reação dos clientes foi a pirataria do BAISC, que resultou em uma famosa "Carta Aberta aos Hobistas" do Bill Gates.

A exclusividade da MITS estava prejudicando a Microsoft com mais que as baixas vendas do BASIC. Embora a Microsoft tivesse fechado acordo com outros fabricantes que usavam outros processadores, o primeiro grande negócio em vista era com a Tandy/Radio Shack cujo TRS-80 usava o Z80 que estava coberto pela exclusividade da MITS. Em meados de 1977 a Microsoft estava em dificuldades financeiras. A sorte da Microsoft foi que Ed Roberts tinha negligenciado itens básicos do acordo, inclusive não pagando os royalties combinados. Com base nisto a Microsoft conseguiu cancelar o acordo na justiça e fechar o negócio com a Tandy e equilibrar as contas.

O Sistema Operacional do PC-IBM

Quando a IBM resolveu desenvolver o seu computador pessoal, ela decidiu usar componentes de mercado, inclusive o BASIC da Microsoft e o sistema operacional CP/M da Digital Research. Como todos sabem o PC-IBM acabou sendo lançado com um sistema operacional da Microsoft, o MS-DOS.

Até o final de sua vida, Gary Kildall (dono da Digital Research) teve que agüentar a versão de que ele tinha ido passear em seu avião ao invés de atender a IBM. Na verdade, Kildall cuidava mais da parte técnica da Digital Research, quem cuidava dos contratos com os fabricantes de hardware era a sua esposa, Dorothy.

No dia da visita da IBM, Gary foi cumprir uma visita agendada anteriormente com outro cliente (pilotando realmente o seu avião) e Dorothy atendeu os representantes da IBM. Antes de dizer qualquer coisa, um advogado da IBM solicitou que ela assinasse um NDA (Non-Disclosure Agreement). Dorothy fez aquilo que todos nós sabemos ser o certo antes de assinar um documento: leu-o cuidadosamente. O documento era terrivelmente favorável à IBM. Dorothy fez aquilo que os advogados sempre recomendam: recusou-se a assinar e passou a negociar o texto do contrato. Embora este impasse tenha sido vencido, a relação entre a Digital Research e a IBM nunca foi boa. Também não ajudou nada o fato do CP/M-86 ter sido repetidamente adiado.

Como foi que Bill Gates se comportou quando a IBM entrou em contato com ele? A reação inicial dele foi: "a IBM é uma grande companhia". Ao contrário de Kildall, Gates se envolvia diretamente nas negociações. E não teve dúvidas em cancelar uma reunião com o chairman da Atari para atender a IBM, vestir um terno e gravata e convocar para a reunião um assistente - Steve Balmer. Ao ser apresentado o NDA, Bill Gates deu uma passada de olhos e assinou sem hesitar.

Enquanto que a diferença de cultura entre as empresas era um problema na relação entre a Digital Research e a IBM, Bill Gates se esforçava para agradar a IBM, apesar de tanto a Microsoft como a Digital Research terem um bando de hippies nos seus quadros. Quando, preocupada com os atrasos e os conflitos com a Digital Research, a IBM perguntou a Bill Gates se ele poderia fornecer também um sistema operacional, ele já tinha a resposta na ponta da língua (embora ainda não tivesse o produto).

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