domingo, outubro 26, 2014

Crítica: Business Adventures

Este livro me foi recomendado "pessoalmente" pelo Bill Gates, através do Linkedin (a mesma recomendação pode ser vista no Wall Street Journal). Curiosos sobre o que este livro tem a nos ensinar?



Bussiness Adventures contém doze artigos do jornalista John Brooks. Ao contrário de muitos jornalistas atuais que procuram passar as informações de forma seca e rápida, Brooks prefere se alongar mais em descrições e busca entender mais a fundo os personagens. Embora ocasionalmente isto se torne enfadonho, na maioria das vezes aumenta a imersão do leitor na narrativa e torna as histórias mais emocionantes. O tom sério é várias vezes quebrado por uma ironia fina (com destaque para "The Impacted Philosophers").

Vejamos do que trata as doze histórias do livro:

The Fluctuation narra uma pequena crise na Bolsa de Valores em 1962. É um pretexto para discutir o funcionamento das bolsas, tomando como base um livro de 1688 que descreve a primeira bolsa criada em Amsterdam em 1611.

The Fate of the Edsel conta uma história muito mencionada nos EUA: o fracasso do lançamento da linha Edsel pela Ford em 1958. Porque a linha fracassou? Como foram tomadas as decisões equivocadas? O artigo mostra como, apesar da aparência de decisões sérias, tomadas com base em pesquisas de mercado, as coisas não ocorreram bem assim. Por exemplo, no começo do projeto alguém (um "puxa-saco"?) propôs o nome Edsel (filho de Henry Ford e ex-presidente da Ford). A família rejeitou veementemente (o presidente era Henry Ford II, filho de Edsel) e muito dinheiro foi gasto em pesquisas de nomes. No final, em uma reunião rápida o nome acabou sendo Edsel mesmo.

The Federal Income Tax fala sobre o imposto de renda americano (na época em que foi escrito): sua história (impostos sobre a renda só conseguiram se firmar com as grandes guerras), seus regulamentos e, principalmente, suas estranhas isenções.

A Reasonable Amount of Time trata do primeiro caso de acusação de inside information.A primeira vista, a regra é clara: fatos que não são de conhecimento público não podem ser usados como base para a negociação de ações. Mas, a partir de quando suposições se tornam um fato? E quando um fato passa a ser conhecimento público? Brooks conta o caso da Texas Gulf Sulfur, que descobriu um grande veio de minério. Teria cometido crime o vice-presidente que comprou ações da empresa logo após a primeira perfuração exploratória? E o diretor que participou da coletiva em que a descoberta foi anunciada, permaneceu conversando por pelo menos vinte minutos após o seu final e depois ligou para um amigo banqueiro?

Xerox Xerox Xerox Xerox - ainda estamos muitos anos antes do surgimento da interface gráfica para computadores (que portanto não faz parte da história). Mas existe muita coisa interessante antes disso, desde o surgimento da empresa como uma licenciada do mimeografo de Tomas Edison. A falta de interesse inicial das empresas em copiadoras, o longo processo de desenvolvimento da copiadora xerográfica (que só foi possível graças ao investimento da Universidade Estadual de Ohio), o impacto sobre as empresas, a questão dos direitos autorais e as filosofias incomuns da empresa. A Xerox surpreendeu a todos ao tomar partido em assuntos públicos, a começar pelo apoio à controversa criação da ONU.

Making the Customers Whole - em 1963, outra crise na bolsa. Desta vez um golpista conseguiu quebrar duas corretoras, o que poderia significar a perda de dinheiro e ações de muitos investidores. A história conta a inédita iniciativa da bolsa em recuperar estas perdas.

The Impacted Philosophers se refere à descoberta, em 1961, de um cartel das empresas de equipamentos elétricos para dividir entre elas as vendas ao governo e outro clientes, visando garantir margens maiores (ainda bem que isto não acontece mais, certo?). O que Brooks investiga é o caso da maior delas, a GE, que tinha normas internas muito explícitas contra a prática. Estas normas não somente eram distribuídas anualmente (contra a assinatura dos empregados) como mencionadas frequentemente nas reuniões da área comercial. Para explicar isto, Brooks toma ao pé da letra a explicação da empresa: ocorreu um imenso mal entendido. Só assim para aceitar histórias surreais como o funcionário que reclamou para o chefe que ele não piscou ao mencionar as normas na reunião ou o outro funcionário que dizia para o chefe que estava indo "se reunir com os rapazes" quando ia para as reuniões de acerto de preço. Com isto os funcionários garantiam estar mantendo os chefes informados e os chefes garantiam ignorar os acertos. Muita gente foi condenada, mas ninguém graúdo.

The Last Great Corner é outra história sobre a bolsa. Especuladores tentam derrubar o valor das ações de uma empresa, valendo-se de negócios futuros (vendendo ações que não possuem, um aspecto bastante esquisito das operações em bolsa). O dono da empresa resolve se defender buscando um corner: assumir o controle de todas as ações de forma a obrigar os especuladores a comprá-las dele próprio, ao preço que ele estipular. Um caso que vai se tornando mais emocionante à medida em que o prazo para concretização dos negócios vai se esgotando.

A Second Sort of Life trata de um personagem curioso: David Lilienthal. Lilienthal foi um dos líderes de um polêmico projeto da política do New Deal, o Tennessee Valley Authoroty. Sendo uma poderosa empresa pública e representando a intervenção governamental, a TSA foi considerada por muitos uma iniciativa socialista. Em 1946, Lilienthal foi apontado como chefe da Comissão de Energia Atômica americana, que gerenciava o uso da energia atômica tanto para fins militares como civis. Em 1950 ele se desligou desta comissão e se tornou um homem de negócios, no que foi muito bem sucedido. Por último, ele criou uma empresa, Development and Resources Corporation, para fornecer consultoria em grandes projetos públicos no estrangeiro. Brooks não apenas revisa toda esta carreira, mas procura entender as motivações de Lilienthal.

Em Stockholder Season Brooks se dedica a uma atividade interessante: assistir as reuniões anuais de acionistas das grandes empresas, intrigado por relatos de situações tensas e promessas de empresas de tomar medidas duras para manter a ordem. O resultado é ao mesmo tempo esclarecedor e divertido.

One Free Bite trata de um outro assunto polêmico.A mudança de emprego de um cientista passa a depender de uma decisão judicial, quando a empresa tenta barrá-la devido ao risco dele contar os segredos industriais ao concorrente. O título vem de um dos argumentos jurídicos envolvidos: não se pode considerar um cachorro perigoso antes que ele ataque alguém, portanto todo cachorro tem direito a uma mordida.

In Defense of Sterling é outra história emocionante, mas sem um final definitivo. A narrativa começa em 1964, quando a libra esterlina está sob um ataque especulativo e os EUA resolvem ajudá-la, buscando para isto o apoio de outros países. É uma luta longa, com vitórias temporárias e que em certo momento se converte em um ataque ao dólar. Como pano de fundo, o funcionamento das moedas e seus padrões de referência. Recomendo a leitura do artigo da wikipedia sobre a libra esterlina e o dolar para saber os capítulos seguintes desta batalha.

Veredito

Recomendado.

Em alguns instantes a leitura é monótona e o texto foi escrito há quatro décadas atrás, mas contém descrições interessantes do funcionamento do mundo de negócios e, principalmente, dos sentimentos envolvidos.

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